“CARTA DE APRENDIZADO
‘Longa é a
arte, breve a vida, difícil o juízo, fugaz a ocasião. Agir é fácil, difícil é
pensar; incômodo é agir de acordo com o pensamento. Todo começo é claro, os
umbrais são o lugar da esperança. O jovem se assombra, a impressão o determina,
ele aprende brincando, o sério o surpreende. A imitação nos é inata, mas o que
se deve imitar não é fácil de reconhecer. Raras as vezes em que se encontra o
excelente, mais raro ainda apreciá-lo. Atraem-nos a altura, não os degraus; com
os olhos fixos no pico caminhamos de bom grado pela planície. Só uma parte da
arte pode ser ensinada, e o artista a necessita por inteiro. Quem a conhece
pela metade, engana-se sempre e fala muito; quem a conhece por inteiro, só pode
agir, fala pouco ou tardiamente. Aqueles não têm segredos nem força; seu
ensinamento é como pão cozido, que tem sabor e sacia por um dia apenas; mas não
se pode semear a farinha, e as sementes não devem ser moídas. As palavras são
boas, mas não são o melhor. O melhor não se manifesta pelas palavras. O
espírito, pelo qual agimos, é o que há de mais elevado. Só o espírito
compreende e representa a ação. Ninguém sabe o que ele faz quando age com
justiça; mas do injusto temos sempre consciência. Quem só atua por símbolos é
um pedante, um hipócrita ou um embusteiro. Estes são numerosos e se sentem bem
juntos. Sua verborragia afasta o discípulo, e sua pertinaz mediocridade
inquieta os melhores. O ensinamento do verdadeiro artista abre o espírito, pois
onde faltam as palavras, fala a ação. O verdadeiro discípulo aprende a
desenvolver do conhecido o desconhecido e aproxima-se do mestre.’ ”
[Trecho do romance ‘Os anos de
aprendizado de Wilhelm Meister’ (Wilhelm
Meiters Lehrjahre) de Johann Wolfgang von Goethe]